Clarinha e suas mamães

Clarinha e suas mamães

domingo, 18 de dezembro de 2011

Filhos de Gays

Outro dia, enquanto esperava minha amada no trabalho dela pra irmos pra casa, peguei uma revistinha Marie Claire e comecei folheá-la, me deparei com a seguinte reportagem

Filhos de Gays

`Conheci meu segundo namorado na escola, tínhamos 16 anos.Ele fazia parte da turma dos skatistas, era popular.Eu estava apaixonada e o achava bem bonito.Ficamos pela primeira vez no shopping que frequentávamos com amigos. Passávamos as tardes namorando na frente do meu prédio.Numa dessas tardes, quando fizemos dois meses de namoro, resolvi contar a ele que minha mãe era transexual.`Minha mãe eh homem`, falei.Ele deu uma risada, fingiu que não me ouviu.Sem entender a reação dele, repeti o que havia dito.Ele desviou o olhar, balançou a cabeça e disse...`Nao sei, não, Bruna.Como eu vou apresentar sua mãe para os meus amigos?Quando ela chegar vou dizer, essa aqui eh meu sogro?`.Demorei uns segundos para assumir para mim mesma que ele estava sendo preconceituoso.Quando me dei conta do que estava acontecendo, senti ódio.O príncipe lindo ficou feio.Falei que ele ia ficar sozinho, virei as costas e fui embora.Jamais namoraria um preconceituoso.Meu `pae` sempre me ensinou a ter orgulho da historia dele e da minha.`
O depoimento acima eh da estudante paulistana Bruna Peixe dos Santos, 19 anos.Sua mãe biológica eh conhecida por Xande.Ele nasceu Alexandra, ha 38 anos, mas diz que sempre se sentiu um homem na pele de mulher.Ha oito, assumiu  a transexualidade.Hoje, Xande se prepara para fazer uma cirurgia de retirada das mamas e do útero, enquanto preside a Associação da Parada do Orgulho GLBT de Sao Paulo.Bruna chama Xande de pai, embora tenha sido gerada por ela.Xande, ainda Alexandra, era casado com uma mulher quando decidiu ter um filho e transou com um amigo para engravidar.`Nao tenho contato com meu pai biológico `, diz Bruna.`Na infância chamava o Xande de mãe e sabia que ela era lésbica.Sempre conversávamos abertamente sobre isso.Hoje ele esta casado com outra mulher.Nunca questionei ou me revoltei com as escolhas dele.Isso nunca interferiu na maneira como cuidou de mim ou no amor que sentimos um pelo outro.Amor de pai e mãe eh amor de pai e mãe e ponto.Quem não entendi isso não eh digno da minha amizade, muito menos do meu amor.`
Bruna faz parte de uma geração de crianças que cresceu em famílias onde o pai, a mãe ou os pais e as mães são homossexuais assumidos.Quando ela foi concebida, setores mais conservadores da sociedade questionavam a qualidade da educação e do desenvolvimento de crianças como ela.Entre os `problemas` apontados, diziam que elas poderiam desenvolver traumas por não terem pai e mãe do sexo masculino e feminino, tornar-se homossexuais(como se isso fosse um problema) ou seriam jovens mais promíscuos que os crescidos em familias heterossexuais.A historia de Bruna-que fala abaixo, gosta de se vestir com looks românticos, mora com o namorado e eh boa aluna-assim como a de outras crianças que cresceram em famílias alternativas, somadas as pesquisas cientificas, derrubam os preconceitos.`A opção sexual da minha mãe nunca teve interferência na minha educação.O problema esta fora de casa`, afirma Bruna.Tanto eh que ela evita andar de mãos dadas com o pai na rua por medo de ser alvo de ataques homofóbicos, como os que aconteceram na região da avenida paulista, em Sao Paulo, nos últimos meses.
Hoje, qualquer homossexual pode ter um filho legalmente no Brasil.No mês passado, o Conselho Federal de Medicina(CFM) divulgou uma resolucao em que aprova o uso da fertilização por casais do mesmo sexo.A medida tem forca de lei.Antes dela, os médicos costumavam pedir autorização ao CFM para o procedimento.Na pratica, um dos membros do casal se declarava solteiro para fazer o tratamento e evitar complicações burocráticas.O mesmo acontecia com a adoção por casais gays.No ano passado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou a adoção de uma menina por um casal de mulheres no Rio Grande do Sul.O caso serve como jurisprudência para outros semelhantes.Dessa forma, a adoção por casais homossexuais fica liberada no Brasil, embora ainda não exista lei que trate do assunto.`O poder legislativo eh omisso ao não aprovar leis a favor dos direitos dos homossexuais.Na pratica, eh a Justiça quem exerce esse papel`, diz a advogada Maria Berenice Dias, especializada em direito homoafetivo.
Os políticos tem medo de aprovar uma lei polemica em um pais tradicionalmente machista e católico como o Brasil.Quando o STJ aprovou a adoção gay, a Confederação Nacional de Bispos do Brasil(CNBB) se manifestou contraria a decisão.O padre Luiz Antonio Bento, assessor da comissão para vida e família da CNBB, disse que  a medida violava o direito das crianças de crescer com homens e mulheres no papel de pais.`Cremos que a questão da adoção por casais homossexuais fere o direito da criança de crescer nessa referencia familiar`, afirmou.
A ciência caminha em direção oposta a Igreja.A Associação Americana De Psicologia emitiu uma nota em que diz que a eficiência da criação, do desenvolvimento e do bem-estar das crianças não depende da orientação sexual dos pais.Um estudo feito no ano passado pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra, com 80 crianças e jovens filhos de gays e lésbicas mostrou que eles são felizes e tem orgulho de suas famílias.Os entrevistados, de 4 a 27 anos, disseram sentir que suas famílias são especiais.`Crianças que sabem desde pequenas que seus pais são homossexuais costumam lidar bem com essa situação `, diz a psicologa Vera Lucia Moris, que coordena um grupo de pais gays em Sao Paulo.La, 30 homens discutem todos os meses questões ligadas ao tema.
Se, por um lado, gays e lésbicas estão preparados para ter  filhos felizes, por outro, a sociedade ainda caminha para aceitar essas novas famílias.O preconceito se manifesta nas ruas, nos clubes, nos parques, e, principalmente, nas escolas.Na pesquisa inglesa, os entrevistados apontaram o bullying como principal problema de sua condição.Afirmaram que as agressões que sofrem não são tratadas com a mesma seriedade que a discriminação racial.No Brasil, a situação eh parecida.Um estudo realizado pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, em parceria com o Ministério da Educação, no ano passado com 1,4 mil professores, gestores e estudantes em 11 capitais mostrou que as autoridades escolares não sabem como trabalhar a diversidade sexual nem combater a homofobia.Por isso, eh comum que as crianças evitem contar na escola a homossexualidade dos pais.`O bullying contra homossexuais eh o segundo mais comum nas escolas brasileiras.Perde para a violência contra deficientes mentais`, diz Ana Beatriz Barbosa Silva, psiquiatra e autora do livro `Bullying, mentes perigosas nas escolas.`

A Solidão da Diferença

Luana, 16 anos, só topou dar entrevista sob anonimato.`Desde pequena convivo com comentários maldosos sobre o fato de a minha mãe ser lésbica.`Luana foi adotada por um casal de mulheres aos 2 meses.A mãe biologica era dançarina e o pai um conhecido do casal.Luana seria entregue a um orfanato e o casal decidiu cria-la.Quando Luana tinha 5 anos e chamava as duas mulheres de mãe, elas se separaram.`Hoje, moro com a minha mãe em Santos, mas sempre vou visitar a minha madrinha em Sao Paulo.`(Uma das mães de fato batizou Luana)Ela diz ter mudado varias vezes de escola por conta do bullying.
O episodio mais marcante aconteceu quando ela estava na quarta serie, tinha 9 anos.Tomava lanche com amigas no patio da escola e uma menina da sexta serie se aproximou do grupinho.`Sua mãe eh sapatão.Sua mãe calca 44!`Os pequenos olhos puxados de Luana se estalaram e o coração disparou.Ela disse as amigas que a menina mentia.`Fiquei paralisada.Nao sabia como agir.`O sinal do recreio tocou e o grupinho voltou para a classe.As amigas acreditaram na versão de Luana e não tocaram mais no assunto.Ela diz que não conseguiu prestar atenção na aula naquele dia.`Segurando o choro, tentei aparentar normalidade para que ninguém percebesse meu nervosismo nem tocasse naquele assunto novamente`, diz.A menina da sexta serie tinha visto a mãe de Luana no carro com a namorada, no horário da saída.`Desabei de tanto chorar sozinha no meu quarto.Nunca comentei sobre essa historia com ninguém.`
Nos dias que se seguiram ao episodio, ela conta que ouviu comentários nos corredores da escola.`Uma menina falou para a outra que não era bom ser minha amiga.Como minha mãe era lésbica, eu poderia me apaixonar por ela.Ela não falou aquilo para me afetar, nem viu que eu estava perto`,diz.`Outros alunos começaram a me olhar com cara de curiosidade, alguns se afastaram.Nao comentei nada com minha mãe.Militante que eh, tinha medo que ela fosse tirar satisfação e chamasse mais atenção.Mudei de colégio naquele ano.Ate hoje não tenho coragem de falar para meus colegas de classe que minha mãe eh homossexual.Quando as pessoas ficam sabendo, agem como se eu fosse lésbica também.Sofro o preconceito de uma escolha que não eh minha`, afirma.`As vezes me pergunto como tudo isso foi acontecer comigo, choro sozinha, me revolto.Mas a verdade eh que todo mundo tem alguma coisa na família que eh diferente ou difícil de ser aceita, falada.O fato de eu ter sido vitima de preconceito me ajuda a entender melhor como eh a dor dos outros.Penso em virar psicologa.`
Bruna diz que também foi vitima de bullying na escola.Quando estava na sexta serie, foi isolada pelos colegas de classe por ser filha de um transexual.`Convidei uma amiga para brincar em casa num fim de semana.A mãe dela foi busca-la.Na segunda feira, quando cheguei a escola, essa amiga disse que não podia mais falar comigo.A mãe a proibiu de ser minha amiga.A menina contou que meu `pae` era transexual para os colegas da classe, que nunca me falaram nada, mas me isolaram.Foi uma época triste, em que eu ficava sempre sozinha, não conversava com ninguém.Quando tinha trabalho em grupo, eu sobrava e era sorteada pela professora.Nessa fase, perdi o interesse pelos estudos e minhas notas pioraram.Nenhum professor ou a direção da escola se manifestou sobre o que estava acontecendo.Superei esse momento sozinha`.
Ana Beatriz Lobo, 19 anos, filha do apresentador Leão Lobo, diz escolher os amigos para quem conta que o pai eh gay.`Primeiro vejo se a pessoa tem a mente aberta`, diz.Sua mãe biológica trabalhava na casa de Leão quando engravidou.`Ela pensou em tirar a criança.Mas eu disse para ela não fazer aquilo, que ajudaria a criar a menina.Quando a Bia tinha uns 8 meses, acordou no bercinho e estendeu os bracinhos para mim.Cheguei perto e ela me chamou de papai.Foi uma emoção soh, naquele momento eu já amava muito aquela menina`, afirma Leão.
Bia lembra de um episodio em que foi alvo de preconceito.Quando tinha 10 anos e voltava da escola, uma menina que vendia balas na frente de sua casa gritou que Bia era adotada e que seu pai era veado.`Comecei a chorar e entrei correndo no prédio.Nao consegui reagir`, afirma.Ela assume que foi mimada pelo pai por não ser sua filha biológica.`Eu quero escolher os namorados do meu pai, por exemplo.Ele gosta de uns caras nada a ver-um deles chegou a roubar brinquedos meus para dar para os parentes, alem de passar a perna na família.Eu queria que ele namorasse(estilista)Marc Jacobs`, diz Bia, autora de um blog de moda.`Quando leio  comentários ofensivos na internet sobre meu pai ser gay, continuo sentindo raiva, mas sei que eh coisa de gente atrasada.Ter um pai gay faz com que eu abomine os preconceitos.O importante eh ter uma família feliz`.

4 comentários:

  1. Sao boas historias de vida..
    Que servem para o preconceito ainda existente no mundo.
    Beijo

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  2. Foda!!

    Essa reportagem me fez ficar por alguns minutos na frente do pc sem piscar.

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  3. Meninas, que resolução é esta que aprova os tratamentos de fertilização em casai homoafetivos?Precisamos ler esta resolução, pois queremos realizar um procedimento de fertilização com óvulos da minha companheira para que eu possa gerar,pois a clínica de fertilização quer garantir a legalidade deste procedimento.Desejamos muito ter outro filho e deste modo, estamos ansiosas.

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